quinta-feira, outubro 20, 2011

Espirro Prolixo.

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                Na manhã quente de um verão brasileiro, enquanto o sol despontava no céu com mais de um milhão de raios a derreter as poucas nuvens que se atreviam a flutuar pela imensidão do céu azul. Nuvens essas que mais pareciam pequenos e quase transparentes flocos de fumaça, visto o infinito ao qual estavam sendo comparadas, e o céu, colorizado pelo mais intenso tom de anil, tom esse que não era comum, pois mais parecia que os gases que compõem nossa atmosfera, estavam se condensando para formar um céu palpável, a qualquer criatura rastejante na terra. Nele também se compunham muitas cores dentro de um diadema, fracas mais visíveis a olho nu, era a bela visão da cor do espectro solar, se confundindo com a cor do próprio céu. Mas sabendo que tal evento expunha sua mais colorida fraqueza, destituindo-lhe de toda nobreza e atribuindo a ele o simples papel de um mendigo apaixonado, o velho Sol multiplicava seus raios de luz a fim de impedir quaisquer olhos a se fixarem em seu ato de amor desesperado.  Como podia ele, o titã intempestivo que arrastava tudo consigo, se apaixonar tão loucamente por essa pequena esfera agora azul? Seu amor foi tão forte que quase a levou à morte na tentativa de se aproximar, mas notando que sua amada era frágil, a deixou em distância segura para que apenas seu mais gentil calor pudesse a abraçar. Mercúrio, o pequenino vilão apaixonado, quis lutar pelo amor da donzela azul, mas a caminho de sua batalha foi aniquilado, mesmo assim seu corpo sem vida garantiu-lhe parte da vitória, pois ficou orbitando entre seu maior inimigo e sua amada, e mesmo morto teve sua glória. Venus, que era apaixonada pelo velho titã, percebeu que não poderia impedir aquele amor através de um confronto direto e um plano ela se pôs a elaborar, decidiu que o melhor a fazer era se colocar entre seu amado e sua rival, a uma distância segura para que nenhum dos dois pudessem lhe fazer mal. Para completar seu malévolo plano, sempre que o titã vem para iluminar um dos lados da face de sua amada, lá está Venus brilhando no fim da madrugada, se impondo entre o Sol e a donzela azulada.
                Entre as guerras e paixões mal resolvidas, o amor entre a Terra e o Sol não pôde ser impedido e em meio a esse namoro sempre atrapalhado, se entregaram sem pensar em pecado e esse ato gerou vida, os filhos de um amor celestial. Dentre esses filhos, numa casa pequenina, uma porta se abria e lá de dentro saía uma linda menina, de cabelos enrolados, de cada lado de sua cabeça uma trança escorria e na ponta de cada trança, um laço avermelhado seus cabelos prendia. Alheia a sua criação, não tinha a menor noção do motivo de sua existência, apenas fixava seus olhos no belo dia, sabendo de forma inconsciente que dali que vinha sua essência.
                Perto de sua casa, o silêncio cedia espaço ao progresso da humanidade desenfreada, carros, motos, aviões, caminhões, homens construindo estradas, matando a própria mãe, enquanto o sol se lamentava sem nada poder fazer, pobre de minha amada dizia ele, sem ao menos se mexer. Era tanta fuligem no ar, tanta poluição que precisávamos de filtros de ar, melhores que nossos pulmões.  Pobre donzela azul, sendo destruída por sua própria criação, as lágrimas escoriam dela como a lava de vulcão. Desesperada e sem saber o que fazer, decidiu que seu fim seria a solução, enfraqueceu suas defesas e deixou acontecer, seus filhos destruíram a camada protetora que lhes deu vida e por seu amado novamente seria aquecida, pelo calor que um dia abdicou para a vida florescer.
                Novamente voltando à menina, alheia a tudo que acontecia, nem percebera as milhares de partículas invisíveis de fuligem que suas narinas receberam, ela só queria respirar fundo e sentir o ar da manhã. Seus olhos encolheram e começaram a lacrimejar, sua cabeça voltou-se para trás sem ela comandar, seu pequeno narizinho coçava sem parar e suas mãos lutavam para em seu rosto chegar.  De repente, antes de qualquer reação raciocinada, seu corpo todo se projetou para frente e uma força vindo de dentro, quase da alma, fez aquela sensação estranha passar:
                - Atchin!
                - Saúde minha filha, Deus te crie. – Disse a mãe para a pobre menina, que de tão forte espirro ficou toda descabelada, com uma das tranças desamarrada, enquanto tentava livrar-se da coriza.

João Fernando
20/10/2011

4 Response to Espirro Prolixo.

20 de outubro de 2011 às 15:53

Muito legal esse texto, mesmo sendo engraçado, trata de um tema bem sério... adorei!

1 de novembro de 2011 às 23:14

Eu não achei nada engraçado, não, você deu um toque de humor para quebrar a seriedade da mensagem, mas menino este amor entre o Sol e a Terra é descrito por muitos poetas,mas nenhum que eu li chegou aos pés do seu texto, o sol renunciando para que seu amor pudesse gerar vida, e a vida por ela gerada lhe agredindo sem piedade, então tristemente ela percebe que o sacrifício do amado foi em vão, lindo demais meu amigo, lindo beijos Luconi

1 de novembro de 2011 às 23:20

João porque no seu blog não tem o +1, eu sempre procuro para clicar, porque clicando no +1 seu texto vai aparecer nas pesquisas do google como indicado, é muito bom, vai lá nos meus e vê que no fianl de cada texto tem +1, beijos Luconi

3 de novembro de 2011 às 18:36

Oi Márcia, fico feliz que tenha gostado desse texto também, as vezes deixo a mente livre aí aparecem alguma linhas como essas.
Adicionei o Botão +1, eu estava tendo alguns problemas com ele por conta do Layout do site, mas já foi resolvido.
Paz e Luz!

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